quarta-feira, janeiro 30, 2013

FRAGMENTOS DE UMA CARTA


A carta missiva ou mandadeira (…) é uma mensageira fiel que interpreta o nosso ânimo aos ausentes (…)
FRANCISCO RODRIGUES LOBO, Corte na Aldeia


Minha Querida Amiga,
Há muito que não te escrevia. O tempo corre depressa, bem sabes, mais depressa do que as ilusões que vamos construindo, e quando damos por ele está muito à frente de nós, longe daquilo que pensámos e desejámos fazer. Das últimas cartas que te escrevi, não tenho, de resto, boas recordações: foram cartas que ficaram sem resposta ou a que só respondeste com meias palavras, discursos que deixavam espaço para a dúvida e a incerteza. Aceitei essas cartas com bonomia, (…)
Se te escrevo hoje, não o escondo, é porque ultimamente muito me têm falado de ti. Dizem-me que estás diferente, que têm dificuldade em compreender-te, e, o que mais me preocupa, que terias deixado de sorrir e renunciado talvez ao refúgio do amor. Imagina, tu que sempre te deixaste guiar pelo coração, tu que amavas, conhecias e sentias a voz solar da poesia: Paroles de Jacques Prévert, lembro-me bem, Rappelle-toi Barbara / Il pleuvait sans cesse sur Brest ce jour-là / Et tu marchais souriante / Épanouie ravie ruisselante / Sous la pluie.
Não sei o que se terá passado contigo, mas a acreditar no que me dizem acho que o caso é sério e merece uma palavra minha. Por vezes, Minha Amiga, as coisas acontecem de forma diferente da que esperamos. Nem tudo é como parece, nem todos os sentimentos se desenvolvem como os imaginamos. Sei bem que (…)

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