sábado, outubro 18, 2008

A IMPERTINÊNCIA DE SENTIR ( XI )

Compreende-se bem por que razão o romance Jogo da Cabra Cega, publicado em 1934, foi retirado do mercado e proibido pela censura salazarista durante cerca de trinta anos. Romance modernista, não compatível com a moral vigente e a ordem social e política estabelecida pelo ideal do corporativismo, só lhe foi autorizada uma 2ª edição no ano de 1963, quando o seu autor já se tornara uma figura proeminente da nossa vida literária.
Trata-se de um texto denso, perturbador, no qual a virtude e o vício, o bem e o mal, o amor e o ódio se assumem muitas vezes como categorias indistinguíveis. Sem Deus, ou apesar de Deus, nada mais resta ao sujeito individual, outrora uno, que a aventura da dispersão e do estilhaçamento: ser ele e o outro, e tudo ao mesmo tempo. É assim que lendo este José Régio não podemos deixar de nos lembrar de alguns textos de ficção de Mário Sá-Carneiro.
(Ilustração: reprodução do óleo sobre tela Poeta de Deus e do Diabo, de Ventura Porfírio, datado de 1958; Casa-Museu José Régio, Portalegre.)

domingo, outubro 05, 2008

A IMPERTINÊNCIA DE SENTIR ( X )

No desfecho dum romantismo brasileiro povoado de índios e cânticos nacionalistas, Castro Alves foi o poeta dos escravos, da vergonha brasileira e da consciência abolicionista. Chamaram-lhe condoreiro, de condor, ave soberba que sobreleva no seu voo os altos píncaros dos Andes.
É bom reler O navio negreiro, Vozes d´África e A cachoeira de Paulo Afonso, do melhor que se escreveu, em oitocentos, na língua portuguesa. E do lado de lá do mar!