terça-feira, abril 30, 2013

O BELO E A ARTE

Vénus Verticordia, Dante Gabriel Rossetti (1828-1882)
Publico esta  imagem acompanhada de umas simples, ingénuas e talvez despropositadas reflexões:  O belo artístico é aquilo que nos transforma, não sei dizer se para bem ou para mal, porque a arte é vasta e não comporta dicotomias. Um dia destes, se for capaz, explico melhor.
(Escrito depois de ter lido, ou treslido, os ensaios de JOSÉ RÉGIO “Em torno da expressão artística” e “A expressão e o expresso”   Três Ensaios sobre Arte, 2ª edição, Porto, Brasília Editora, 1980, pp. 7-101.)

domingo, abril 28, 2013

CENTENÁRIO DE ÁLVARO CUNHAL

Exposição sobre a vida e obra de Álvaro Cunhal, integrada nas comemorações do seu centenário. Local: Sala do Risco, Pátio da Galé, Rua do Arsenal /Terreiro do Paço. Independentemente daquilo que se pense sobre o ideólogo e o político, é impossível não considerar  o  papel do intelectual e  do artista, o exemplo de sacrifício e coerência na luta prosseguida.  Um  encontro  com a memória de um homem que marcou de forma singular a nossa história recente. A não perder.

NOSSA LAREIRA BREVE


O que sentimos, não o que é sentido,
É o que temos. Claro, o inverno estreita.
            Como à sorte o acolhamos.
Haja inverno na terra, não na mente,
E, amor a amor, ou livro a livro, amemos
            Nossa lareira breve.

RICARDO REIS, Poesia, edição de Manuela Parreira da Silva, Lisboa, Assírio & Alvim, 2000, p. 117.
 

segunda-feira, abril 22, 2013

UM TEXTO ADMIRÁVEL

Joséphine Baker (1906-1975)
 
(…) A par de Marcel Proust, André Gide parece pequeno: Crítico traído pelo poder criador, criador traído pelo demónio crítico, Gide prolonga, continua, desenvolve, complica, desfaz, contrafaz, refaz – uma Obra que finalmente se nos impõe! Assimilador de génio, ele próprio se nos desvenda caixa de muitas ressonâncias… Sonho de ser tudo o que não é – por ser um pouco de tudo sem nada ser completamente… senão ele! Porque da sua Obra, é ele que fica. Isto é: o seu espírito perverso, torturado, labiríntico e feminino – no altíssimo grau vedado às mulheres… Depois Pirandello: Poeta de ideias que se fazem carne! Malabarista esfomeado de Absoluto, arrastando os homens à compreensão irónica de todos os seus relativismos. Ou Shaw, Narciso sarcasta e lírico. Violador de falsas honestidades – escrevendo sátiras sobre os cenários convencionais… Ou Freud, que revolucionou a psicologia, a psiquiatria, a crítica; (Depois de Bergson ter revolucionado a filosofia) que nos denunciou (ó Rimbaud!) estudou, e explora este mar de vida obscura, este abismo que nós trazemos dentro de nós, esta estância dos Fados – o Subconsciente! E tu, Chaplin, Mestre de todos os poetas modernos! Boneco mais vivo que todos os homens vivos que tu manejas… como bonecos. Que tu sabes como se maneja. Escamoteador único duma moeda única – a tua! aquela em que já não estão em lados opostos os dois lados opostos da vida…
E reagindo sobre as estilizações de Nijinsky, refrescando a saturação das inteligências, vinda do fundo da terra, da animalidade e do tempo, Josefina Baker passa dançando – como um vento quente cujo fim é passar.
JOSÉ RÉGIO, Manifesto “Literatura Livresca e Literatura Viva”, parte final, “Elogio do século em que estamos, século XX”, presença, nº 9, 9 de Fevereiro de 1928.


sexta-feira, abril 19, 2013

"FADO"

Capa da 1ª edição de 1941 e poema "Fado das Mulheres de Vida Fácil" com desenho de Júlio.  
(...)
E homens há de toda a sorte,
Doentes de todo o mal,
Tarados de todo o vício,
Que naquele amor venal,
Filho do crime e da morte
Vão buscar gosto ou flagício.
(...) 


AS INESPERADAS LEITURAS


“Imitação de Cristo”, de Tomás de Kêmpis (1379-1471), Biblioteca Básica VERBO, Livros RTP.

O verdadeiro conhecimento e desprezo de si mesmo é a mais útil e a mais sublime lição. Grande sabedoria e perfeição é ter em boa conta as virtudes alheias e evitar de si mesmo qualquer presunção. Se vires que alguém pecou publicamente, ou comete faltas graves, não te deves julgar por melhor, pois não sabes quanto poderás perseverar no bem. Todos somos fracos, mas a ninguém tenhas por mais fraco do que tu.

(II.4 – O HUMILDE JUÍZO DE SI MESMO, p.11)
 

quinta-feira, abril 18, 2013

METAMORFOSES

Hoje, em conferência de imprensa, quatro lídimos representantes do governo de Miguel de Vasconcelos.
 
Cessem de Ovídio, Kafka e quejandos as metamorfoses grandes que nos legaram.
Ficámos a saber – o que não é menos extraordinário! – que o subsídio de Natal de funcionários públicos e aposentados, pago em 12 prestações suaves, se transformou agora em subsídio de férias.


NÃO SÓ QUEM NOS ODEIA OU NOS INVEJA

Ricardo Reis, gravura incisa de ALMADA NEGREIROS no pórtico da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Não só quem nos odeia ou nos inveja
Nos limita e oprime; quem nos ama
           Não menos nos limita.
Que os Deuses me concedam que, despido
De afectos, tenha a fria liberdade
           Dos píncaros sem nada.
Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada
É livre; quem não tem, e não deseja,
           Homem, é igual aos Deuses.

           RICARDO REIS / 1-11-1930

quarta-feira, abril 17, 2013

"presença" (1927-1940) - V

Número 1 da 2º série, de Novembro de 1939. Após um ano de interrupção, a revista aparecia com novo aspecto gráfico e número acrescido de páginas.
Mas seria o canto do cisne. Graves desinteligências entre os seus directores (José Régio, João Gaspar Simões e Adolfo Casais Monteiro) não permitiriam ir além de um segundo número da série, saído em Fevereiro de 1940.
Em carta escrita de Portalegre para Alberto de Serpa  (secretário de redacção da revista), com data de 1 de Abril de 1940, diz José Régio: “Estou resolvido a sair da presença, isto é: a acabar com a presença. (…) A causa mais próxima desta minha resolução é que o Adolfo, outra vez incompatibilizado com o João, viu manifestações irritantes de conformismo e burguesismo no “Diálogo Inútil” do nº 2, e pretende responder-lhe, no próximo número, com um artigo que exibiria aos leitores os desencontros internos da direcção da presença… Isso não posso eu suportar.”
A inviabilidade da continuação da revista não resultava somente das divergências existentes entre os seus directores. Havia, por assim dizer, uma dificuldade de ordem espacial: José Régio residia em Portalegre, João Gaspar Simões e Adolfo Casais Monteiro em Lisboa, Alberto de Serpa no Porto. A folha coimbrã - "provincialista", segundo David Mourão-Ferreira - deixara de pertencer ao velho burgo académico. Cada número passara a ser um exercício delicado, gerido a distância, desde a angariação da colaboração e revisão das provas até à impressão e expedição dos exemplares para os assinantes. Além de que José Régio, que era quem efectivamente mandava na presença, tinha outros projectos a que se dedicar.

sexta-feira, abril 12, 2013

"A VELHA CASA"

Visita facultada pelo actual proprietário da casa, Sr. António, em 9 de Abril.
Vocabulário filosófico num livro que pertenceu a José Régio.
Quadro do pintor Júlio (irmão de Régio). Estava guardado num vetusto armário, e não foi fácil encontrar a chave.

quinta-feira, abril 11, 2013

LENDO EM VIAGEM



Passa, lento vapor, passa e não fiques...
Passa de mim, passa da minha vista,
Vai-te de dentro do meu coração,
Perde-te no Longe, no Longe, bruma de Deus,
Perde-te, segue o teu destino e deixa-me...
Eu quem sou para que chore e interrogue?
Eu quem sou para que te fale e te ame?
Em quem sou para que me perturbe ver-te?
Larga do cais, cresce o sol, ergue-se ouro,
Luzem os telhados dos edifícios do cais,
Todo o lado de cá da cidade brilha...
Parte, deixa-me, torna-te
Primeiro o navio a meio do rio, destacado e nítido,
Depois o navio a caminho da barra, pequeno e preto,
Depois ponto vago no horizonte (ó minha angústia!),
Ponto cada vez mais vago no horizonte...,
Nada depois, e só eu e a minha tristeza,
E a grande cidade agora cheia de sol
E a hora real e nua como um cais já sem navios,
E o giro lento do guindaste que como um compasso que gira,
Traça um semicírculo de não sei que emoção
No silêncio comovido da minh´alma...

Álvaro de Campos, “Ode Marítima” (versos finais)

terça-feira, abril 02, 2013

"A EDUCAÇÃO DO ESTÓICO" - V


Quer pouco: terás tudo.
Quer nada: serás livre.
O mesmo amor que tenham
Por nós, quer-nos, oprime-nos.

            RICARDO REIS, Ode 113, 1-11-1930

segunda-feira, abril 01, 2013

"presença" (1927-1940) - IV

Carlota, “a que ficou sem par”, no desenho de José Régio, oferecido a João Gaspar Simões, que serviu para a capa do nº 22 da folha de arte e crítica coimbrã.
"Criada para todo o serviço” na pensão da Rua das Flores, nº 37 (Alta de Coimbra), onde José Régio se alojou durante a sua formatura, era, segundo Simões*, “rebarbativa e terna a um tempo”, tendo "pelo Zé Maria [Régio] uma dedicação de cadela, embora não poucas vezes lhe arreganhasse caninamente os dentes”.
Aparece como personagem em Os Avisos do Destino, terceiro volume do ciclo A Velha Casa.

* JOÃO GASPAR SIMÕES, José Régio e A História do Movimento da Presença, Porto, Brasília Editora, 1977, p. 79