quinta-feira, novembro 30, 2017

TOPÓNIMOS

rio Nabão é um afluente do rio Zêzere que passa na cidade de Tomar. Nasce no concelho de Ansião, no lugar dos Olhos de Água, e a ele junta-se, a cerca de dez quilómetros de Tomar, a nascente do Agroal. Tem um percurso de 61,47 km.
= Fotos de 30-11-2017=
 
 

quarta-feira, novembro 29, 2017

FRAUTA MINHA, QUE TANGENDO

GADANHEIRO (1949), DE JÚLIO POMAR

Lança o brilho da sua lâmina
ao manto plúmbeo do céu.
Deus, escondido e indiferente,
dorme entre as nuvens roxas
da Eternidade.
A terra a quem a trabalha,
grita. E um anjo caído
vem acender línguas de fogo
no ouro da seara.

segunda-feira, novembro 27, 2017

PIZICATO

PIZICATO – Passagem ou trecho de música que se toca dedilhando as cordas de instrumento de arco. Execução da juvenil Orquestra de Cordas do Conservatório Regional Silva Marques, este domingo em Vila Franca de Xira, interpretando justamente Pizzicato Polka, de Johann Strauss II.
 
 

sábado, novembro 25, 2017

FICÇÕES


Ela fustigou-o com os olhos incendiados de ciúme, reverberantes e ao mesmo tempo carregados de sombra. Ele disse para si, tem calma que a crise vai passar, daqui a umas horas, no máximo um dia, tudo voltará ao normal, e lembrou-se de coisas filosóficas como o eterno retorno de Nietzsche ou o refluxo das águas dos rios sob o efeito das marés, algo com que Heraclito de Éfeso nunca sonhou. Era sua convicção profunda de que tudo o que vai há-de voltar, e isso dava-lhe ao mesmo tempo uma grande dose de tranquilidade e outra ainda maior de excitação.   
Você não me convidou para sair no fim-de-semana, esqueceu-se de mim que sou sua amiga e fetiche erótico, disse ela.
Doeu-lhe aquela referência do fetiche erótico, não queria acreditar no desconcerto da acusação, ele que se julgava sem perversões e apenas se habituara a lamber-lhe as covas das axilas e os vales húmidos das virilhas antes de partir para os vôos rasantes da satisfação do corpo. Chamar fetiche a um exercício preludial era algo que não conseguia conceber.
Assustou-se quando passadas as primeiras vinte e quatro horas ela continuava sem responder a telefonemas e mensagens. Depois, faltara a um jantar há muito aprazado com um grupo de amigos e, por último, quase deixara de lhe falar quando por acaso se encontravam na rua: boa tarde, boa noite, passe bem que não posso perder tempo.
Para grandes males, grandes remédios, escreveu-lhe uma carta, dessas de envelope e selo de correio, narrando o deserto em que se transformara a sua vida, só areia e nenhum fulgor de welwitschia na dobra cálida das dunas.
Fechemos a caixa de Pandora dos nossos desentendimentos, aproveitemos os dias e ainda mais as noites, riscou o amante em perigo no papel da carta. Lembre-se de quando lhe dei aquele beijo na mão, foi o instante inicial, é pelas mãos que começam os sonhos e a felicidade dos homens, e para lá do beijo na mão todos os beijos que se seguiram em partes mais húmidas e desafiantes do seu corpo de sílfide, a boca, claro, a boca bilingue, como dizia o poeta Ruy Belo, sendo que os meus significados de  boca e de bilingue são diversos, a língua usa-se em várias bocas e de diferentes formas como muito bem sabe por experiência adquirida. Nenhuma resposta veio. Ela que tanto gostava da fluência da sua escrita, tipo escritor pós-moderno com laivos gordos de classicismo, era uma boa arma, a escrita, mas não funcionou. Venha para mim, acrescentou ainda o coitado em desespero de causa, venha para mim que eu segredo-lhe aquela frase que tanto gostava de ouvir, lembra-se?, e era…
Recebeu em troca um grosso sobrescrito normalizado com carimbo redondo sobre vinheta de correio azul: devolvia-lhe todos os poemas que ele lhe fizera durante mais de três meses. Um deles, feito depois de um passeio à beira-Tejo, terminava assim:
Os rios,
água íntima dos lábios
como li em Fiama, antemanhãs
de escaldantes pélagos.
O poema não saiu grande coisa e bem escusava o poetastro de meter a Fiama ao barulho. Foi castigado por tudo isso: ela arranjou um novo namorado e, coisa extraordinária, ficou a odiar poesia.
 
 
 

quinta-feira, novembro 23, 2017

PINACOTECA

BORIS TASLITZKY (Paris, 1911-2005), o pintor de Buchenwald. Esteve internado no campo de concentração alemão de Agosto de 1944 a 11 de Abril de 1945, data da chegada das tropas aliadas. Ali produziu, com grande dificuldade em reunir materiais, mais de uma centena de desenhos e aguarelas sobre as condições em que viviam os prisioneiros. Taslitzky era de ascendência russa, entrara em 1935 no PCF e estivera em Espanha durante a Guerra Civil.
Aguarela: Le petit camp en février 1945.
Desenho: Portrait de Émile Chevalier.
Fotografias obtidas em 111 Dessins faits à Buchenwald 1944-1945, Paris, La Bibliothèque Française, 1946, apresentação de Julien Cain.
 

quinta-feira, novembro 16, 2017

LEITORES INCOMUNS

Cena do filme O Leitor (2008), de Stephen Daldry. A partir do romance homónimo de Bernhard Schlink.
 

sexta-feira, novembro 03, 2017

«É que isto de amores, tanto desabrocham em solitários de cristal por trás das vidraças como florescem bravos nos carrapiteiros, só a linguagem é que difere.» --- JOSÉ SARAMAGO, em Levantado do Chão, sobre o namoro de Faustina e João Mau-Tempo.
 


quarta-feira, novembro 01, 2017

O LEITOR INCOMUM *

Giovanni Boccaccio (1313-1375) por Andrea del Castagno (c. 1450)
 
No Decameron, de Boccaccio, «cem novelas que sete damas e três mancebos contaram em dez dias», é impossível não atentar no prefácio autoral e na conclusão da obra. No prefácio, a descrição realista da peste que grassou em Florença de Março a Julho de 1348, o seu cortejo de desgraças e a dissolução de costumes engendrada pelo espectro da morte massiva. É nesse clima de terror que se imbrica a ficção dos dez jovens que se fixam num palácio dos arredores da cidade e nele permanecem por dez dias contando histórias uns aos outros para passar o tempo e esquecer o perigo que os rodeia. O facto de estas sete mulheres da alta sociedade florentina serem solteiras e fazerem-se acompanhar, três delas, dos seus pretendentes, traduz um tipo de comportamento que desafia os princípios morais da sociedade ainda medieval. Na conclusão, o autor discorre sobre o conteúdo das histórias narradas. Dirigindo-se às leitoras, diz: «Algumas de vós dirão talvez que ao escrever as minhas histórias dei rédea solta à licença; que, por exemplo, fiz escutar e dizer às damas o que não é próprio para os ouvidos ou para a boca de uma mulher honesta.» Perguntando de seguida: «Mas serei eu mais culpado por tê-las escrito do que os homens e as mulheres que repetem durante todo o dia buraco e cavilha, pau e boceta, salsicha e mortadela, e todos buraco e cavilha, pau e boceta, salsicha e mortadela, e todas as locuções da mesma espécie?» A liberdade e o realismo narrativos das histórias configuram, em relação ao autor e segundo a introdução de Urbano Tavares Rodrigues (Círculo de Leitores), uma demonstração do seu «amor pela vida e o seu ideal de ventura na terra, tão oposto a toda a literatura teocrática medieval.»
 
* Título de um ensaio de George Steiner.