sábado, junho 20, 2009

MINISTRO DEBALDE

O ministro Augusto Santos Silva respondeu à intervenção dum deputado do Partido Ecologista “Os Verdes” que levou um balde para o Parlamento. Um balde furado, pretendendo mostrar com tal auxiliar retórico a ineficiência da política energética do governo.
Falando do verbo baldear, derivado de balde - segundo referiu, muito usado na marinha mercante -, disse o aguerrido ministro que os ecologistas deviam “varrer com baldes de água os (seus) convés” , repetindo imperativamente: “baldeiem dos vossos convés os preconceitos.”
Só que o plural de convés é conveses, de acordo com o que se pode ler, por exemplo, em Celso Cunha e Lindley Cintra, Nova Gramática do Português Contemporâneo, nas regras relativas à formação dos plurais dos nomes.
Um pequeno engano, tão pequeno que nem tira votos, nem prejudica a carreira política do ministro. Isso é, afinal, o que mais interessa, e que se "balde" a língua.

quarta-feira, junho 10, 2009

LUÍS DE CAMÕES ( I )

Camões e as Tágides, Columbano, Museu de Grão Vasco
Há vários meses que, por razões que não são para aqui chamadas, ando acompanhado de Camões. Para ser mais preciso, do Camões épico, o d´Os Lusíadas, o tal poema que serviu em tempos para os estudantes dos liceus se treinarem na divisão de orações. Assim, a epopeia camoniana era apresentada aos liceais não como um corpo vivo, apetecível, mas como um cadáver pronto a ser dissecado sobre uma mesa de anatomia.
Falar d’ Os Lusíadas é tema vasto. Há que ir por partes. Hoje, 10 de Junho, falo do parecer do censor do Santo Ofício, Frei Bartolomeu Ferreira, que analisou a edição de 1572. Diz o dominicano:

Vi por mandado da santa & geral inquisição estes dez Cantos dos Lusíadas de Luís de Camões, dos valerosos feitos em armas que os Portugueses fizerão em Ásia & Europa, e não achey nelles cousa algua escandalosa nem contrária â fe & bõs custumes, somente me pareceo que era necessário advertir os Lectores que o Autor pera encarecer a difficuldade de navegação & entrada dos Portugueses na India, usa de hua fição dos Deoses dos Gentios. (…) Toda via como isto he Poesia & fingimento, & o Autor como poeta, não pretende mais que ornar o estilo Poético não tivemos por incoveniente yr esta fabula dos Deoses na obra, conhecendoa por tal, & ficando sempre salva a verdade da nossa sancta fe , que todos os Deoses dos Gentios sam Demónios.

Ora aí está: Baco, inimigo dos Portugueses, e Vénus, a doce deusa que por mais de uma vez , ao longo da viagem para a Índia, protegeu a armada do Gama, além de todos os outros deuses apresentados por Camões, são demónios, e, ao mesmo tempo, ficções. O bom inquisidor arrumava assim a questão, sem ver nada de escandaloso no poema: nem Vénus a seduzir Júpiter no Canto Segundo, nem os amadores das ninfas no Canto Nono.
Convinha muito à Ordem de S. Domingos aquilo que Camões diz no poema contra os Jesuítas, émulos dos Dominicanos no árduo trabalho de conquistar o Reino dos Céus. Só por tal rivalidade permitiram os homens da Inquisição (Dominicanos) que a epopeia fosse publicada sem nódoas expurgatórias. Ainda bem.

domingo, junho 07, 2009

PLATÃO EM DIA DE ELEIÇÕES

Jean Delville, L´École de Platon, 1898, Musée d´Orsay, Paris
O partido que escolhi nestas eleições está à beira de ganhar. Uma vitória esmagadora, por maioria absoluta, embora, em verdade, não seja bem um partido – talvez uma espécie de frente popular, heteróclita, com distintos níveis de motivação e consciência. Assim, não foi por acaso que me encontrei a ler, neste fim-de-semana, vastos passos do diálogo Górgias de Platão. A retórica e a política sem princípios, a criação pela persuasão de um estado de crença sem ciência – foi tudo isso que o Mestre da Academia denunciou que a mim me afastou das urnas. O Cavaco que vote, mais o Dias Loureiro. Se calhar, apesar da reclusão indigna, até o Oliveira e Costa não deixará de exercer o sacrossanto dever. Têm boas razões para isso. Prova-se, afinal, que não são ingratos para com o sistema que os criou.