“Elementar, meu caro
Watson”, disse Silvério Hermes, detective particular, enquanto folheava o dossiê acabado de tirar do arquivador
metálico.
“Contou-me a florista”,
acrescentou, “que ela levou a vida sempre a fugir, dificilmente aguentando uma
relação durante o tempo normal que as relações costumam ter.”
“Tempo normal?”,
estranhou Watson, “então há um tempo normal para a duração das relações?”
“Claro, o tempo da
paixão, do enamoramento e do amor, essas coisas de que falam os entendidos.”
Watson teve uma
expressão de assentimento, enquanto o detective anotava umas palavras nas
folhas do dossiê. Acabavam de deglutir a última fatia de pizza e Hermes extraiu
de uma gaveta da secretária a garrafa achatada de brande.
“Ainda lhe vai fazer
mal ao fígado, meu caro”, advertiu Watson, sem que as suas palavras causassem o mínimo
efeito no bebedor.
Eram duas horas da
tarde. O detective vestiu a gabardina, expirou uma voluta de fumo na mordedura
branda do cachimbo, meteu no bolso o isqueiro e a embalagem de tabaco, parou
uns segundos, pensativo, como se reflectisse sobre um assunto importante, e
disse:
“Volto às cinco. Se o
homem telefonar, diga-lhe que está tudo a andar e que pode passar para levar o
recibo do adiantamento.”
“O homem?”
“Sim, o marido.”
“Ah!”, exclamou Watson,
passando a mão pela cabeça num gesto indeciso e lento.
(...)
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