domingo, novembro 04, 2012

RETRATO DE VIDA COM NARCISO AO FUNDO

Dominava-o uma espécie de dislexia dos fonemas
do amor e por isso se acomodava ao fulgor
dos silêncios, à morosa retórica dos actos falhados
que a psicanálise tão bem explicou.
Era um solitário entre penhascos povoados,
um viajante que não conhecia a viagem.
Pensa agora que se pudesse recomeçar separaria
o afecto do orgulho e saberia distinguir
o viço de uma folha de árvore de um galho seco da mesma.
Mas isso é o que pensa e só diz nas escritas de água
com que se paramenta. Na prática,
faz como o filho de Cefiso e Liríope:
debruça-se no regato do seu ego
e continua a amar-se.

2 comentários:

Joca disse...

Não sei que andas a ler, mas que é bonito, é...:)

Manuel Nunes disse...

Obrigado. Ando a ler MANUEL ANTÓNIO PINA, "Poesia Reunida", edição da Assírio & Alvim.