quinta-feira, março 23, 2006

POLITICAMENTE INCORRECTO

GEORGE SAND, desenho de ALFRED DE MUSSET


George Sand foi o pseudónimo literário de Amandine Lucie Aurore Dupin, francesa nascida em Paris, vivente entre 1801 e 1876.

Alfred de Musset, poeta e dramaturgo romântico, um dos seus famosos amantes, é o autor do desenho que nesta página se reproduz. Outro seu amante, não menos famoso, foi Chopin, uma ligação que durou perto de dez anos.

É significativo que esta escritora, autora de um grande número de romances de diversos subgéneros literários – histórico, iniciático, epistolar, de crítica social – tenha tido necessidade, para se afirmar no mundo da literatura e do jornalismo, de usar um pseudónimo masculino.

George Sand é um exemplo de mulher bem sucedida, que viveu do que escreveu, profissional da escrita numa sociedade conservadora onde o papel da mulher estava confinado ao lar e à reprodução familiar.

Em 1848, ano da queda do rei Louis-Philippe e do início da Segunda República francesa, George Sand deixou-se tentar pela política. Mas depressa se desiludiu, retirando-se para o campo e começando um novo ciclo de produção romanesca de inspiração rústica.

Não é por mera casualidade que lembramos esta mulher na semana em que se agitaram as águas da nossa política em torno da iniciativa legislativa sobre a fixação de quotas para mulheres nos cargos políticos elegíveis.

E perguntamos: precisam as mulheres que lhes dêem a mão para entrarem na Assembleia da República ou nos órgãos autárquicos? Temos a ideia de que se elas desejassem uma participação mais activa na vida política há muito que o teriam conseguido. Dominariam hoje as estruturas dos partidos e os órgãos do poder da mesma forma que já dominam, ou estão em vias de dominar, as carreiras universitárias e a investigação científica, o jornalismo, a vida literária e artística. E isto por várias razões: porque são mais fortes e inteligentes do que os homens, mais determinadas e laboriosas, e porque não há fatalidade biológica ou condicionamento de educação que as impeça, se assim quiserem, de chegar onde chegam os homens. Só que elas manifestam pela política essa saudável anorexia que as afasta dos jogos do poder. As mulheres são um anti-poder, é assim que as vemos. Até porque não nos parecem edificantes muitas das experiências de poder político no feminino.

Significa isto que tudo está bem e nada é preciso fazer? Nem pensar! Infelizmente, ainda persistem na sociedade actual os condicionamentos e discriminações que levaram Amandine Dupin a adoptar o pseudónimo George Sand. Só que o problema não se resolve com quotas ou qualquer outra medida administrativa. É uma questão de reforma de mentalidades que só a educação pode gerar. É um trabalho de gerações a ser feito por homens e por mulheres.

Por isso votamos contra o projecto legislativo neste comentário. Comentário político. Politicamente incorrecto.



D.E.

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