...
Escuta o coração, Marília bela,
Escuta o coração, que te não mente.
Mil vezes te dirá: '' Se a rigorosa,
Carrancuda expressão de um pai severo,
Te não deixa chegar ao caro amante
Pelo perpétuo nó, que chamam sacro,
Que o bonzo enganador teceu na ideia
Para também no amor dar leis ao mundo;
Se obter não podes a união solene,
Que alucina os mortais, porque te esquivas
Da natural prisão, do terno laço
Que com lágrimas e ais te estou pedindo?
Reclama o teu poder, os teus direitos,
Da justiça despótica extorquidos;
Não chega aos corações o jus paterno,
Se a chama da ternura os afogueia;
De amor há precisão, há liberdade.
Eia, pois, do temor sacode o jugo,
Acanhada donzela; e do teu pejo,
Destra iludindo as vigilantes guardas,
Pelas sombras da noite, a amor propícias,
Demanda os braços do ansioso Elmano,
Ao risonho prazer franqueia os lares.
Consista o laço na união das almas;
Do ditoso himeneu as venerandas,
Caladas trevas testemunhas sejam;
Seja ministro o amor e a terra templo,
Pois que o templo do Eterno é toda a terra.
Entrega-te depois aos teus transportes,
Os opressos desejos desafoga,
Mata o pejo importuno; incita, incita
O que só de prazer merece o nome.''
( Excerto do poema ''Epístola a Marília´´
também conhecido pelo verso inicial ´´Pavorosa ilusão da Eternidade´´)
II.mo e rev.mo sr. bispo inquisidor geral. - Constando-me que n´esta côrte e reino giravam alguns papeis impios e sediciosos, mandei averiguar quem seriam os auctores d´elles, e encontrei que de uma parte dos mesmos era o seu auctor Manuel Maria de Barbosa du Bocage, o qual vivia em casa de um cadete do regimento da primeira armada, André da Ponte, que é natural da ilha Terceira: mandei proceder contra um e outro e á apprehensão nos seus papeis, e não se achando o sobredito Manuel Maria, se encontrou sómente o André da Ponte, que foi preso e apprehendidos os papeis, entre os quais se achou um infame, impio e sedicioso, que se intitula ''Verdades duras'', e principia:
''Pavorosa illusão da eternidade''
e acaba por
''Opprimir seus iguais com o ferreo jugo''
como consta do auto da àchada, que acompanha a conta que me deu o juiz do crime do bairro Andaluz, a quem eu havia encarregado esta diligencia. Do mesmo auto verá v. exª os mais papeis e livros, impios e sediciosos, que se apprehenderam ao dito André da Ponte, os quaes remetto inclusos com a devassa a que mandei proceder para averiguação da verdade, e as perguntas que se fizeram aos ditos Manuel Maria de Barbosa du Bocage, que passados alguns dias também foi preso a bordo de uma embarcação em que hoje ia fugido no comboio para a Bahia, e André da Ponte do Quintal da Camara. Remetto também a declaração que me fez da cadeia o dito Manuel Maria de Barbosa du Bocage, para que esse santo tribunal lhe dê o peso que merecer. V. exª me insinuará o mais que quer que eu faça sobre estes dois réus, os quaes conservo na prisão, esperando a restituição d´estes papeis, logoque forem examinados por esse santo tribunal pela parte que lhe toca. Deus guarde a v. exª. Lisboa, em 7 de novembro de 1797.= DIOGO IGNACIO DE PINA MANIQUE.
(Extraído de Simão José da Luz Soariano,
''História da Guerra Civil e do estabelecimento do Regime Parlamentar em Portugal'',
Lisboa, Imprensa Nacional, 1879)
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