Tanto quanto me permite a leitura do 1º capítulo, avisto um diálogo
(eventualmente conflitual, seguramente complementar) entre a pintura e a
fotografia. Predadora, ainda que testemunhal, a arte de fotografar em cenários
de guerra. É interessante que na sexta-feira passada, no Clube de Leitura do
Museu Ferreira de Castro (Sintra), Julieta Monginho, autora de Um Muro no Meio do Caminho, tenha
manifestado o seu pudor em fotografar os refugiados do campo da ilha de Chios
(Grécia) onde trabalhou como voluntária. Em Pérez-Reverte, O Pintor de Batalhas, o protagonista Faulques descarrega a sua
velha Leica 3MD com objectiva de 50 milímetros sobre uma rapariga deitada numa
esteira num campo de refugiados do sul do Sudão: « A rapariga era jovem e de
uma beleza translúcida apesar da cicatriz horizontal que lhe marcava a testa e
dos lábios fendidos (…) pela doença e pela sede. E tudo, a cicatriz, as gretas
dos lábios, os dedos finos e ossudos da mão junto ao rosto, as linhas do queixo
e a ténue insinuação das sobrancelhas, o fundo do entrançado romboidal da
esteira, pareciam confluir na luz dos olhos, no reflexo de claridade nas íris
negras, na sua fixa e desesperada resignação. Uma máscara comovedora,
antiquíssima, eterna, onde convergiam todas aquelas linhas e ângulos. A geometria
do caos no rosto sereno de uma rapariga moribunda.»
domingo, outubro 14, 2018
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