A autobiografia de Vladimir Nabokov (1899-1977), cujo título na edição portuguesa é Na Outra Margem da Memória, foi designada como Speak, Memory desde a sua primeira versão de 1947.
No prefácio da edição de 1966 é referido pelo autor que a primeira ideia para título teria sido Speak, Mnemosyne , ideia entretanto abandonada por razões comerciais, porque, segundo conselho recebido, “as velhinhas nunca pediriam um livro com um título que não soubessem pronunciar”. As “velhinhas”daqueles já distantes tempos eram, pelos vistos, grandes leitoras. Convinha pois tê-las em conta.
Ao ler hoje o prefácio e os três primeiros capítulos da edição portuguesa, e ao reparar na palavra que não vingou no título – Mnemosyne – pensei na questão da memória, aspecto importante da teoria autobiográfica pelo uso que dela faz o autobiógrafo quando se dispõe a recuperar factos passados há muitos anos, alguns deles do período longínquo da infância.
É o problema da verdade da autobiografia, dos sempre possíveis desvios da memória (sob a forma de omissões ou embelezamento dos factos narrados) e dos impulsos inconscientes que levam a dar como verdadeiro aquilo que nunca foi.
Mnemósine era na mitologia grega a deusa da Memória. Mas mais do que isso era a mãe das nove musas das artes liberais, sendo que uma delas, Calíope, era a musa da poesia e da eloquência. E é assim que tudo faz sentido no título que Nabokov escolheu e não teve coragem de levar por diante. A autobiografia, que nasce da memória, acolhe-se por direito ao templo de Calíope: porque embora sendo história, é também poesia; porque sendo eloquência, é sobretudo retórica. Tanto como deleitar, a autobiografia está obrigada a convencer o leitor das verdades que narra. Mesmo que sejam ficções.
No prefácio da edição de 1966 é referido pelo autor que a primeira ideia para título teria sido Speak, Mnemosyne , ideia entretanto abandonada por razões comerciais, porque, segundo conselho recebido, “as velhinhas nunca pediriam um livro com um título que não soubessem pronunciar”. As “velhinhas”daqueles já distantes tempos eram, pelos vistos, grandes leitoras. Convinha pois tê-las em conta.
Ao ler hoje o prefácio e os três primeiros capítulos da edição portuguesa, e ao reparar na palavra que não vingou no título – Mnemosyne – pensei na questão da memória, aspecto importante da teoria autobiográfica pelo uso que dela faz o autobiógrafo quando se dispõe a recuperar factos passados há muitos anos, alguns deles do período longínquo da infância.
É o problema da verdade da autobiografia, dos sempre possíveis desvios da memória (sob a forma de omissões ou embelezamento dos factos narrados) e dos impulsos inconscientes que levam a dar como verdadeiro aquilo que nunca foi.
Mnemósine era na mitologia grega a deusa da Memória. Mas mais do que isso era a mãe das nove musas das artes liberais, sendo que uma delas, Calíope, era a musa da poesia e da eloquência. E é assim que tudo faz sentido no título que Nabokov escolheu e não teve coragem de levar por diante. A autobiografia, que nasce da memória, acolhe-se por direito ao templo de Calíope: porque embora sendo história, é também poesia; porque sendo eloquência, é sobretudo retórica. Tanto como deleitar, a autobiografia está obrigada a convencer o leitor das verdades que narra. Mesmo que sejam ficções.
1 comentário:
Gostei. Somos seres que se vão formando com a narrativa, precisamos dela como do ar.
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