domingo, maio 24, 2009

A IMPERTINÊNCIA DE SENTIR ( XVI )

Depois de A Cidadela Branca, leio Istambul de Orhan Pamuk. Pergunto-me se o hüzün istambulense (uma forma de melancolia típica dos habitantes da cidade) não terá algo a ver com a saudade portuguesa, esse sentimento de privação e incompletude em que Teixeira de Pascoaes viu a essência do génio português, aquilo a que chamou a única síntese perfeita entre o sangue ariano e o sangue semita. Pamuk dá-nos sobejos exemplos dessa melancolia de Istambul, um nevoeiro que vem do fundo dos tempos, sitiando as almas dos homens e os seus sentimentos.
Talvez a única ligação entre o hüzün da grande metrópole turca e a saudade portuguesa seja esse comum sentimento de decadência, de perdidos fulgores civilizacionais. Também eles, os turcos otomanos, tiveram as suas Índias. Submeteram vastas regiões do Médio Oriente, do leste da Europa e da África mediterrânica, tendo chegado às portas de Viena e instalado o pânico entre a Cristandade dos séculos XV e XVI.
Mas tiveram Lepanto, como nós tivemos Alcácer Quibir, e tudo se desfez. Chega sempre um momento em que a História se ri da soberba dos povos.

4 comentários:

Ricardo António Alves disse...

A ver se leio o Pamuk...
Abraço.

Manuel Nunes disse...

Caro Ricardo,
Este livro do Pamuk tem como subtítulo “Memórias de Uma Cidade”. São as memórias do autor sobre a cidade do Bósforo, mas também comentários de vários escritores turcos da primeira metade do século XX, e, igualmente interessante, também aborda as impressões de viagem de vultos das letras franceses do século XIX: Gustave Flaubert, Gérard Nerval, Théophile Gautier. Estes são apenas alguns, o Pamuk cita outros, e de outras nacionalidades, embora tenha uma grande inclinação para os de língua francesa. O que ele não sabe é que o nosso Ferreira de Castro também visitou Istambul (no final dos anos 30, creio) e deixou-nos um interessante relato dessa sua viagem no capítulo “Turquia” de “A Volta ao Mundo”. Li esse capítulo: uma visão muito negativista da Turquia dos sultões e um certo entusiasmo pela república nascente de Mustafá Kemal. Este livro vai à comunidade de S. Domingos de Rana na próxima sexta-feira. Se desse para aparecer, poderia dizer-nos algo sobre a viagem a Istambul do grande escritor de Ossela.
Abraço,

Ricardo António Alves disse...

Oh meu caro, que convite agradável.
Não prometo, mas se for levo a primeira edição d'A Volta ao Mundo, coma as fotos e ilustrações.
Um abraço.

P disse...

Estou a ler 'snow'. envolvente.