sábado, abril 16, 2011

TOMAR


Charolinha, Mata Nacional dos Sete Montes, Tomar


Quem não ouviu contar histórias na infância ou delas não guardou na memória o seu maravilhoso irrepetível, pode ter crescido e se tornado gente, pode até ser pessoa válida e de bem, mas encontrar-se-á fatalmente amputado na sua plenitude imaginativa e criadora. Para nos tornarmos homens, é preciso que, em meninos, tenhamos aberto os olhos de espanto perante o canto de sereia das narrativas.

Garrett deixou-nos o testemunho do efeito que nele causaram as histórias da velha Brígida, criada que tinha todo o jeito e traça de bruxa, e era cronista-mor de feitiços e milagres:

(…) Suas longas histórias recontando / De almas brancas trepadas por figueiras, /De expertas bruxas de unto besuntadas / Já pelas chaminés fazendo víspere, /Já indo, às dúzias, em casquinha de ovo /À Índia de passeio numa noite… /E ai! se o galo cantou, que à fatal hora / Encantos quebram, e o poder lh’ acaba.[1]

Amanhã vou a Tomar em passeio com a Comunidade de Leitores da Biblioteca Municipal de S. Domingos de Rana. Foi em Tomar que, em menino, ouvi as melhores histórias da minha vida: histórias de bruxas, de lobisomens e de almas penadas – histórias que não metiam medo e em que queria com toda a força acreditar. Acho que foram a base da minha formação e valeram tanto ou mais que todas as disciplinas e seminários da Universidade. Uma dívida que não paguei e só de uma forma conseguirei pagar: nunca esquecer quem me as contava.



[1] Dona Branca, canto terceiro, estrofe III.

2 comentários:

Custódia C. disse...

Manel

Já cá não vinha há um tempo e passei um bom bocado a ler as tuas últimas postagens (enquanto ouvia a bela voz da Marisa Monte, que adoro).
De facto (com c é claro!), se não podemos vencer a crise, o melhor é rir um pouco por conta dela.
E que belo Domingo passámos em Tomar :)

Manuel Nunes disse...

Sim, Minha Amiga.
E agora Portalegre.