terça-feira, fevereiro 07, 2023

HELENA VANTACHE

Série "Paisagens Interiores" # PC.25, 2021, acrílico sobre papel, 100x100 cm.

53 pinturas em formatos médios e pequenos que estiveram em exposição na Sociedade Nacional de Belas-Artes entre 20-12-22 e 14-01-23. Num lugar de grande tradição artística: ter em conta, para além do mais, as Exposições Gerais de Artes Plásticas (1946-1956) e a conferência de Mário Dionísio, "Conflito e Unidade da Arte Contemporânea", ali proferida em 1957.

Não me vou deter na componente técnica da pintura para a qual não tenho competência nem inclinação. Se bem entendi, a artista, em vez de pincel, recorre a meios e processos de “espalhar as tintas”, o que confere às obras um grau de aleatoriedade que me fez lembrar um filme que vi em Serralves, há uns anos, sobre as telas queimadas de Miró. Espalhar as tintas: uma questão mais de sensibilidade do que de inteligência, o que não está mal.

E pego nas palavras-chave da exposição: “paisagens interiores”, “inquietação”. Inquietação, segundo a letra da canção de José Mário Branco, sendo que ela – a inquietação ou o desassossego – é a razão da criação artística. Não há verdadeiro artista acomodado ou sossegado. Há o desassossego dos sonhos dos surrealistas e de todos os que transcendem a mera representação do real. A arte é deformação do real. E sobre paisagens interiores, cito o ajudante de guarda-livros da Rua dos Douradores: «Nas minhas próprias paisagens interiores, irreais todas elas, foi sempre o longínquo que me atraiu, e os aquedutos que se esfumam — quase na distância das minhas paisagens sonhadas, tinham uma doçura de sonho em relação às outras partes de paisagem — uma doçura que fazia com que eu as pudesse amar.»

Amar esta pintura que não é paisagem nem rosto e se refugia no longínquo que nos leva a amar a própria paisagem. A paisagem é um estado de alma, disse Amiel. Amamos os sonhos e o que radica no mais fundo do ser. Como o poeta, em Gedeão, também o pintor tem de esmagar «as boninas, os cravos e os lírios», ainda que eles estejam presentes, pela imaginação, naquilo que faz.

Independentemente disto, a pintura de Helena Vantache será o que a cada um disser.


Sem comentários: