Adolfo Rocha – que viria a adoptar o pseudónimo MIGUEL TORGA – , enviou um exemplar do livro a Fernando Pessoa. Este agradeceu por carta de 6 de Junho de 1930, dizendo: «Li-o e gostei d´elle. A sua sensibilidade é do typo egual á do José Régio – é confundida, em si mesma, com a intelligencia. O que em si é ainda por aperfeiçoar é o modo de fazer uso d´essa sensibilidade.» Pessoa avança de seguida com considerações sobre o uso da sensibilidade, a inteligência e de como a arte se move no meio de tudo isto.
As considerações não agradaram a Adolfo Rocha que em carta de 9 de Junho responde: «Recebi a sua carta amável e confusa. Venho, portanto, agradecer a gentileza e, ao mesmo tempo, dizer-lhe que reputo de obscuro o seu conceito de poesia.» E acrescenta: «(…) a sua opinião a respeito do meu livro será a mais desinteressante de todas as recebidas…»
Fernando
Pessoa dirá a João Gaspar Simões, por carta de 28 de Junho, que teria escrito à
pressa a opinião sobre A Rampa. Além
de que, na verdade, não foi ele a escrevê-la: «(…) transferi a redacção [da
carta] para o sr. Engº Alvaro de Campos, cujo talento para a concisão em muito
sobreleva ao meu.»
Sempre que o
engenheiro naval por Glasgow era chamado aos assuntos de Fernando Pessoa, a
coisa corria mal. Foi assim com Ofélia Queiroz e as cartas de amor, e também no encontro do Café Montanha com José Régio e Gaspar Simões. O raio do homem
deitava tudo a perder, mas, faça-se-lhe justiça, não o escondia, como se vê nos versos de certo poema: «Todas as horas faço gaffes de civilidade e etiqueta»
e «Tenho feito muitas coisas más, muitas coisas reles, muitas infâmias.» Assim mesmo.
= Citações: 1) Cartas entre Fernando Pessoa e os directores da presença, edição e estudo de Enrico Martines, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1998. 2) Arquivo Pessoa: obra édita, Poesia de Álvaro de Campos.