«Toda Lisboa mais ou menos culta
assumia perante o poeta-esteta João Salvador* uma posição complicada e peculiar:
pois ao mesmo tempo o admirava (ou não sabia se devia admirá-lo), o desprezava
um pouco, repetia a seu respeito anedotas indecorosas, o temia pela sua língua
delicadamente viperina, e alimentava por ele uma curiosidade que o próprio se
empenhava em açular sem satisfazer. (…) Uma popularidade pouco invejável,
diziam os moralistas e puritanos. Até alguns colegas o diziam; – e colegas em
todos os sentidos, embora alguns secretos. Os versos destes eram vulgares, por
isso eram estes que mais o odiavam e invejavam. (…) Na geral curiosidade que o
envolvia, sobrelevava a da sua origem (que ele caprichava em ocultar): Donde
teria vindo? Em que meio se gerara e criara? Talvez em Alfama, (…) » – JOSÉ RÉGIO em Vidas São Vidas, quarto romance do ciclo A Velha Casa.
* João
Salvador é uma transposição ficcional do poeta António Boto.
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