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pinturas em formatos médios e pequenos que estiveram em exposição na Sociedade
Nacional de Belas-Artes entre 20-12-22 e 14-01-23. Num lugar de grande tradição
artística: ter em conta, para além do mais, as Exposições Gerais de Artes Plásticas (1946-1956) e a
conferência de Mário Dionísio, "Conflito e Unidade da Arte Contemporânea", ali proferida em 1957.
Não
me vou deter na componente técnica da pintura para a qual não tenho competência
nem inclinação. Se bem entendi, a artista, em vez de pincel, recorre a meios e
processos de “espalhar as tintas”, o que confere às obras um grau de aleatoriedade
que me fez lembrar um filme que vi em Serralves, há uns anos, sobre as telas
queimadas de Miró. Espalhar as tintas: uma questão mais de sensibilidade do que
de inteligência, o que não está mal.
E
pego nas palavras-chave da exposição: “paisagens interiores”, “inquietação”.
Inquietação, segundo a letra da canção de José Mário Branco, sendo que ela – a inquietação
ou o desassossego – é a razão da criação artística. Não há verdadeiro artista
acomodado ou sossegado. Há o desassossego dos sonhos dos surrealistas e de todos
os que transcendem a mera representação do real. A arte é deformação do real. E
sobre paisagens interiores, cito o ajudante de guarda-livros da Rua dos
Douradores: «Nas minhas próprias paisagens
interiores, irreais todas elas, foi sempre o longínquo que me atraiu, e os
aquedutos que se esfumam — quase na distância das minhas paisagens sonhadas,
tinham uma doçura de sonho em relação às outras partes de paisagem — uma doçura
que fazia com que eu as pudesse amar.»
Amar esta pintura que não é paisagem nem rosto e se refugia no
longínquo que nos leva a amar a própria paisagem. A paisagem é um estado de
alma, disse Amiel. Amamos os sonhos e o que radica no mais fundo do ser. Como o
poeta, em Gedeão, também o pintor tem de esmagar «as boninas, os cravos e os
lírios», ainda que eles estejam presentes, pela imaginação, naquilo que faz.
Independentemente disto, a pintura de Helena Vantache será o que a cada um disser.